quinta-feira, 7 de outubro de 2010

UNO

Pra que tanta ladainha, tantas religiões, tantas regras e leis pra levar a algo tao simples? Todos os aprendizados, todas as análises de conflitos, todos os insights levam apenas a uma conclusão: somos uma coisa só. Estamos todos ligados. Somos a unidade no conjunto. Pra escolher uma palavra pequena e simpática, somos o UNO. E quanto mais nos afastamos disso, mais causamos o mal, o conflito, o desequilíbrio.

Seria bem mais fácil entender o uno se não tivéssemos consciência individual e soubéssemos que somos únicos e mortais (de um ponto de vista individual). E aí se forma o paradoxo: É dificil pro nosso cérebro entender que somos peças mínimas, porém significantes, de um mecanismo muito maior: a vida. Não individualmente, claro, mas num sentido amplo. Sentido do uno. As vezes até penso que esse paradoxo é o que dá "dinâmica" prioritária às coisas, que o universo está sempre nos testando, pra ver até que ponto podemos equilibrar as coisas.

A natureza é destituída de 'bondade' ou 'maldade'; ela segue apenas (misteriosas e maravilhosas) leis imutáveis quando dá a vida ou a morte (para renovar o que havia criado). Tudo nela se equilibra, há uma reação a cada ação, há o retorno a tudo que cada ser dá a ela, há um antídoto para cada veneno, uma recompensa para cada sofrimento. Não há "crueldade" em sua sabedoria. A borboleta devorada pelo pássaro se torna aquele pássaro, e o pequeno pássaro morto por um animal está apenas cumprindo seu papel. Isso não pode ser considerado um "mal" na Natureza, nela não há esse conceito. O homem já começa errado temendo a morte, o seu maior fantasma, que não é um mal, só se vista de forma individual. O mal surge a partir do ego, da (in)consciência humana e sua origem está inteiramente no homem, que apesar de raciocinar, e apesar de ter toda a natureza para observar e pela qual ser grato, se dissocia dela. Ou seja, a natureza é perfeita, é como tem que ser. A partir dessa compreensão, devemos confiar nela, e observar mais atentamente, vendo que tudo nos mostra que a vida é o uno. Se agimos na direção oposta desse uno, com egoísmo e ganância a ponto de prejudicar alguém, estamos contra a natureza, e criando o desequilíbrio. Estamos aqui pra trabalhar pela natureza, pelo uno.

Por exemplo: Reparem como a vida nos disponibiliza prazeres diversos, mas mostra que a partir do momento que só pensamos no nosso prazer individual e/ou imediatista, não entendemos o caminho do uno (começando com as consequências no nosso corpo, depois na nossa relação com as pessoas, com o mundo e assim por diante) e facilmente nos excedemos. Este excesso traz doenças, miséria, sofrimento físico e mental, e isso acaba sendo transmitido pra quem nos rodeia e pra gerações futuras. Outro exemplo: A ambição e o desejo de assegurar felicidade e conforto para aqueles que amamos através da obtenção de reputações e riquezas são sentimentos naturais e dignos, mas quando eles excluem o bem de outros, transformam o homem em um tirano cruel e ambicioso, um egocentrista, um egoísta, e trazem miséria para os que estão ao seu redor. porque vai de encontro ao UNO.

Querer ganhar sem ver o lado de todos os outros causa desequilíbrio, quem discrimina ou é separacionista gera desequilíbrio, quem se acha melhor, quem projeta vontades/expectativas nos outros ou quem é intolerante gera desequilíbrio. Quem se acomoda no seu conforto, quem não é atencioso com outros ou faz jogos em nome do interesse individual (ou de um grupo isolado) tambem. Quem não entende a necessidade dos outros, e não compreende suas limitações, está tambem isolacionista, portanto contra o uno, e gera desequilíbrio. É simples! O uno é o DEUS, chamem ele do que quiserem chamar. Sempre penso que as religiões existem porque é mais fácil seguir regrinhas, pré-moldados, sem pensar muito (inclusive utilíssimo pra adormecer nossos medos e incompreensões), e é custoso alcançar essa compreensão pela (1)educação, (2)consciência e (3)exercício.. As vezes pode levar toda uma vida.

Claro que amar a si mesmo faz parte desse uno; confiar em si mesmo tambem. SABER que somos uma importante peça desse uno é essencial, e isso não implica em ser vaidoso, orgulhoso ou precisar de aprovação dos outros. Devemos fazer nossa parte com prazer e alegria, sem apontar/acusar/recriminar os outros ou cobrar isso deles. Lembre que qualquer repressão ou tentativa de controlar outros também nos afasta do uno, obviamente. Cada um é responsável por si mesmo e atinge sua consciência no seu ritmo.

Aí alguem pode me dizer "mas se seguirmos esse conceito à risca, pagaremos sempre pelos que não fazem a sua parte". Não acho. Se todo mundo fizesse a sua parte, já estaria bom demais. Acho que não existe mais consciência no mundo porque as pessoas se acomodam e fogem de suas responsabilidades, e isso não é uma critica, deve ser compreendido também como parte natural da vida. Ela sabe o que faz. (Já lutei muito contra o mundo por causa disso, e essa "militância em nome de ideais" era puro desperdício de energia. Hoje acho que o único ideal é em direção ao uno.)

A natureza, repito, é perfeita. Então quem diz que o mundo é cruel, que a vida é ruim, que as pessoas sao estúpidas etc. ou que fica preso em seus problemas (que nada mais são que desafios), alimentando-os, está tambem sendo individualista. O mínimo que podemos fazer, estando como passageiros nessa inacreditável vida e nos compreendendo como "células" desse maravilhoso organismo chamado VIDA, é sempre exercitar a contemplação e a gratidão. Isso trará coisas maiores, e não mesquinharias ou sentimentos individualistas como competição, raiva, vaidade, ciúme, inveja, vingança, remorso, rancor, auto-vitimização e até culpa e medo, esses dois últimos provavelmente os maiores inimigos de uma vida saudável.

E os valores mais cobiçados pela maioria, como poder, imagem, fama e dinheiro? Reflita você mesmo(a) de que forma isso nos afasta do uno. E muito.

As religiões quando falam "amai-vos uns aos outros", "faça ao outro o que gostaria que fizessem a ti" ou "ame todas as criaturas vivas incondicionalmente" apenas querem dar a compreensão do uno. A "evolução" é nada mais do que buscarmos a forma mais pura e verdadeira de nós mesmos, e isso é proporcional a se aproximar da consciência do uno. Mas a compreensão disso tudo está muito além de fórmulas, ou de ler esse texto fazendo movimento positivo com a cabeça.. Está em uma conscientização gradativa que depende de nós, que, uma vez sabendo da existencia desse conflito e da dificuldade dele, partimos para o exercício diário e interminável de sermos humanos cada vez mais "conscientes do uno", pouco a pouco, a cada dia da nossa vida.


texto dedicado a todos aqueles que amo, amei e ainda quero amar.

2 comentários:

Aleta Dantas Câmara disse...

Inspirador :)

Carlos Henrique disse...

Essas reflexões são admiráveis. É belo notar como a vida em si é sublime. O simples ato de se notar como um ser, rodeado por um universo fantástico, e que tudo é um só, as coisas apenas se remoldam, se recriam, é gratificante. É trabalhoso compreender nossa própria condição de seres viventes e descobrir que a vida pode ser mais simples quando guiada de uma forma tão pura e bela, que essa caminhada possa se tornar de uma estupenda explosão de prazeres. Esse texto nos mostra isso, nos faz notar como é possível encontrar formas de nos isentar de todos esses valores, construções culturais, enfim, tudo que nos rodeia, mas que não passa de construção humana e nos ocupa desnecessariamente por nos fazer viver caminhando em direções indefinidas, nos reprimindo e não nos fazendo notar das vendas que nos cegam.
Tenho um texto que se liga a este de alguma forma, mas que traz uma visão exterior a daqui narrada. Vem daquele que vê um mundo de vários grupos, não de um uno (que talvez seja o que possa ser alcançado se todos notassem das estupendas compreensões da compreensão una aqui retratada). Vem de alguém que, como todos (que estão inevitavelmente presos em seu mundo pessoal, egoísta, incompreendido e incompreensível, frutos duma sociedade que caminha nessa direção e com força a protege, com a preservação do que é propriedade e do que tem dono, do que reverencia e exalta a identidade; identidades que não existem, não passam de uma invenção da própria sociedade para que ela mesma, uma entidade supra-existencial ao ser humano, se infle de seu egoísmo que ultrapassa a existêmcia efêmera do ser humano que a estrutura), enquanto contempla nuvens num dia ensolarado, que se arrastam pela imensidão do céu azul, procura dar sentidos as suas formas momentâneas, que naturalmente não necessitam de sentido, nem mesmo desses humanamente concedidos, mas que ali se encontram e singelamente demonstram a infinidade de formas que o uno se faz ter, e como é estupendo simplesmente ser, sem se perder pelas vielas do cárcere da razão.
O texto neste link se encontra: http://114bis.wordpress.com/2014/03/21/eu-e-voce/