segunda-feira, 14 de julho de 2008

cade a ideologia que estava aqui?



Pois eh, acreditem ou nao, parei num festival anti-racista na Italia, e agora sim, um sabado, tive a nocao maior de como funciona isso por aqui.

Dessa vez fui sozinho, tocar a segunda vez no festival. Cheguei umas 18h e ja estava cheio de gente, entao observei o dia inteiro as pessoas, tentando descobrir onde estava o lado mais ideologico e militante do festival. A camisa de um grupo de hip hop que tava passando o som tinha escrito "grupo tal odeia o racismo". Na minha frente, no refeitorio, um italiano sem camisa exibia uma tatuagem enorme no peito com a frase "life is pain" (sim, escrita assim, em ingles), e outro do meu lado com uma grande no antebraco, " love & hate". Outro grupo exibia uma camiseta com um logo com a frase "good night white pride", supostamente representando um racista sendo nocauteado. Sera que um pessoal que esta engajado dessa forma numa causa anti-racista ja nao deveria saber, a essa altura do campeonato, que odio contra odio so gera mais odio?

Mas no geral o clima era tranquilo, como o de comportadas ovelhas. Quase todo mundo com cerveja e cigarro na mao. Durante o dia o lugar parecia uma colonia de ferias sem muitas opcoes de entretenimento. Estranhamente o palco principal (e unico) ficou ate 21:30 (ainda dia) vazio. Depois, so duas bandas (ja que eles tem que parar 3h, pois mesmo sendo no meio do campo, leis sao leis..), a primeira foi de hip hop, daquele tipo tradicional de 20 anos atras, e logo depois uma banda de rock punk. Pra fechar a noite, um dj de drum'n'bass pesado.

Nas barracas, dezenas de imagens do Che Guevara, (sempre bom lembrar que foi um dos mais belicos assassinos do seculo XX, oportunamente transformado em martir do marketing do comunismo apos sua morte) vendendo adoidado em bones, camisetas e bandeiras. Eh evidente que idealismo de butique faz sucesso. Toda hora via camisas negras de bandas ancias: motorhead, iron maiden, sex pistols, metallica, a mais nova delas de 20 anos atras. Ja nao se fazem mais icones como antigamente? Frequentemente me vejo vivendo entre cliches datados ou distorcidos (como o caso do Che, por ex).  

Acho que enfim comeco a entender porque ouco tanto a frase "nasci no tempo errado" entre a garotada. Quem tem 18 anos hoje em dia deve se sentir vivendo em cima de valores clonados, e eh compreensivel que exista o desejo de ter vivido os originais, entao eh criada toda essa nostalgia deslocada. E entao fica mais compreensivel analisar como eh difcil fazer coisas de vanguarda hoje em dia. A absorcao eh dificil , ja que o pessoal ta tao condicionado a consumir pastiche de pastiche. 

Um parentesis: Lembro que quando cheguei em valencia e tinha um grupo enorme de adolescentes em frente a ferroviaria fantasiados de anos 80. A moda 80 realmente ta no apice agora, e voltou de forma caricata, tudo muito colorido, cheio de quadriculados, estampados de zebra, maquiagem carregada, rasgados e mullets. Aquilo foi muito divertido, porque me senti dentro de um comercial do gel new wave (lembram?). Fora o pessoal caracterizado de punk, parece que seguem uma rigoroso dress code definido ha no minimo 20 anos.

Ai lembro de um dos meus filmes preferidos, o invasoes barbaras , que satiriza a decadencia das religioes e a carencia de novas ideologias. Entao vos pergunto, qual o caminho, qual a ideologia? Eh ser cetico? Niilista? Partir pra desconstruir tudo, com uma mentalidade terrorista ou partir pra odiar e matar quem nao pensa igual, como nosso comandande Che? O pensar ecologico nem eh mais uma opcao hoje em dia, eh um dever, e eh dificil quem realmente pensa verde de modo realista (A maioria se orgulha de nao usar sacola de plastico pra ir no supermercado mas deseja trocar de carro todo ano, por ex.).

Fico mais, em primeiro lugar, com o bom humor. Rir pra nao chorar. Por isso que meu artista preferido eh o Banksy, que esfrega na cara da sociedade as hipocrisias e as stronzatas, como se diz aqui na Italia. Fico mais com o trabalhar pras coisas andarem de uma forma um pouco melhor, mostrando arte e cultura pra pessoas que normalmente nao teriam oportunidade de descobrir por elas sos. Fico mais com trabalhar por novas ideias pra formar a cabeca das novas geracoes de forma diferente, mais realista e completa.

Outra coisa que tenho notado aqui na Italia eh o pessoal reclamando e dizendo que vai sair do pais. Estranhamente todo mundo fala, atualmente, da Espanha, como se fosse a terra da salvacao, o pais do futuro. E a Espanha tem crises equivalentes ou piores. O que passa eh que o pessoal nao entende que a crise eh geral, eh um comportamento escapista e bastante individualista querer sair do seu pais, ao inves de tentar melhora-lo, trabalhar por ele, assim que a gente pode criar novos padroes, novas oportunidades, ao inves de torcer pra isso cair do ceu ou idealizar uma "terra prometida" que nao existe.

festa brasileira!

Bastou uma boa festa pra juntar energias boas do festival numa pista de danca. Como eu ia tocar numa pista menor no sabado, nao fiz meu live, e sim uma "noite brasileira". E nem foi anunciado direito, tava so escrito num painel que teria seratta braziliana as 22:30 com DJ Lucio K do Brasil, e logo chegou um grupao e se jogou nas batidas brasileiras. Tocar pra gringos eh um pouco diferente, as vezes coisas com sonoridades bem percussivas e que soam originais pras referencias musicais deles funcionam mais do que classicos. Entao rolaram muitas producoes proprias, sambas novos, antigos, marcatu, maculele, sessao capoeira.. foi bem divertido. Era pra acabar 2 e acabei 3, sob protesto do publico presente. Senti que monopolizei todo mundo do festival com mais de 30, so ficou a garotada la na pista principal, de musica eletronica.

Nenhum comentário: